Por Cláudio Bueno da Silva
Antes de pretender ganhar os céus, o homem precisa compreender o seu papel na Terra diante do seu semelhante e em relação a si mesmo. Antes de espiritualizar-se propriamente, precisa humanizar-se, tornar-se mais humano.
Tem-se falado muito no processo de regeneração da humanidade que, segundo instruções dos Espíritos a Allan Kardec, já teria se iniciado. Entre os espíritas criou-se um clima generalizado de expectativa (meio místico) no que se refere aos “tempos chegados”, como se esse período de renovação tivesse data para acontecer.
Toda a longa trajetória evolutiva do homem até chegar à sua atual concepção físico-psíquica não foi suficiente para transformá-lo significativamente, a ponto de não se poder mais compará-lo, em nenhuma de suas ações, aos seus antepassados primitivos.
Claro que há grande distância separando o homem de hoje do que ele foi há remotas eras. Mas o atavismo do longínquo passado traz ainda à tona, em várias circunstâncias, muito da sua natureza bruta, que se pode observar em surpreendentes atos de agressividade, violência e inconsequência. E, infelizmente, esse não é um fenômeno isolado, pois ocorre ainda em muitas partes do planeta.
O Espírito Lázaro fala dessa situação em “O Evangelho segundo o Espiritismo” quando afirma estar o homem “mais próximo do ponto de partida que do alvo”, (1) quando dominado pelos instintos.
Por outro lado, basta olhar a civilização moderna para constatar que o homem evoluiu bastante, transformou o mundo, viajou no espaço, desenvolveu a inteligência a níveis espantosos. Fez progredir também seus hábitos e costumes sociais polindo-os e dando-lhes uma feição que os distancia da barbárie. Entretanto, seus avanços no campo ético-moral foram bem mais discretos, confirmando as explicações dadas pelos Espíritos da codificação de que o progresso moral não acompanha, no mesmo ritmo, o avanço da inteligência (2). É essa discrepância a causa do desequilíbrio que se constata atualmente no mundo. “Resta-lhes (aos homens) ainda um imenso progresso a realizar: é o de fazer reinar entre eles a caridade, a fraternidade e a solidariedade, para assegurar o bem-estar moral” (3).
Segundo os mesmos Espíritos, um projeto de renovação moral está em andamento na Terra, envolvendo expurgo, exílio para mundos primitivos daqueles que “praticam o mal pelo mal, e que o sentimento do bem não atinge” (...); “irão expiar seu endurecimento, uns nos mundos inferiores, outros em raças terrestres atrasadas, que serão o equivalente a mundos inferiores” (...) (4).
Considerando-se que Deus é justo e seus mecanismos de justiça sabem ler o que se passa em cada consciência; considerando-se que os seres efetivamente maus (grifo meu) são uma minoria audaciosa, conforme sugere a questão 932 de “O Livro dos Espíritos”, e estes deverão abandonar a Terra; considerando-se ainda que o número de Espíritos infantis, ingênuos, indolentes, indiferentes, mas sem maldade (as “almas frágeis” de que fala Herculano Pires no livro “O centro espírita”) são boa parte de nossa humanidade e talvez devam ficar por aqui, conclui-se que estes últimos (os “sem maldade”), juntamente com uma ínfima parcela de Espíritos terrestres mais adiantados, participarão do processo de humanização do planeta.
A tarefa de reequilibrar a vida planetária caberá, então, à maioria dos Espíritos que pertencem à terceira ordem da escala espírita (Espíritos imperfeitos), somada à pequena porção que já adentra à segunda ordem (Espíritos bons), e ainda àqueles que, vindos de mundos mais avançados, reencarnarão em substituição gradual aos exilados. Sem os Espíritos radicais do mal, começará a se desenhar aqui um novo tempo, cujos signos serão o respeito entre os homens e a implantação da vida pacífica, conforme muito bem esclarece todo o capítulo XVIII de “A Gênese”.
Compreende-se, assim, que apesar de ter-se iniciado há mais de um século, a renovação não se dará de uma hora para outra, e que os homens terão muito trabalho pela frente. Porém, com a paulatina mudança de ares, o ambiente da Terra será mais propício à transformação. É aí que “o Espiritismo, mais que qualquer outra doutrina, está apto a secundar o movimento regenerador” (5).
O que o bom senso pede é que continuemos lutando sem desânimo, individual e coletivamente, pelo estabelecimento desse novo estágio entre nós, mas sem as expectativas angustiosas quanto ao tempo, pois “como a natureza não dá saltos” e milagres não existem, os que ficarem precisarão construir esse mundo novo, e essa tarefa levará tempo. Ainda em “A Gênese”, no mesmo texto de Allan Kardec podemos ler: “No dizer dos Espíritos (...) tudo se passará exteriormente como de costume, com esta única diferença, porém diferença capital, que uma parte dos Espíritos que aí se encarnam não mais se encarnará”.
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