Outro dia alguém publicou na internet uma montagem com a foto do Papa Francisco, segurando a férula e com esta frase: “Então você pensou que eu ia acabar com a ‘missa tridentina’?”. Esta publicação revela, o quanto precisamos ir além do básico na teologia e na liturgia da saudável Tradição da Igreja. Pois não existe “missa tridentina”, “missa de sempre”, “missa reformada” e outras bobagens que costumamos dizer e ouvir, existe a Santa Missa este grande e único diálogo com Deus.
Nunca me importei com o lugar onde e com as roupas com as quais as pessoas celebram a Santa Missa, porque nunca vi nisso o problema, mas sim na concepção que se tem de Igreja, do Reino, de Povo de Deus, do sacerdócio, da Redenção, da Eucaristia, do “Deus Conosco”...
Penso que a dificuldade não está na posição em que se fica no altar, mas sim no modo de como compreendemos o Evangelho e de como o anunciamos e no testemunho que damos de Jesus Cristo Ressuscitado.
Voltar sempre de novo para Jesus Cristo, para o Evangelho, esta é a mensagem e a proposta sempre nova de Dom Carlos Duarte Costa. Quem despreza outros por serem “carlistas”, além de injustos e mal intencionadas, demonstram que não querem justamente isto: que o povo de Deus se apodere do Evangelho e faça uso dele. Fazer com que o povo se apodere do Evangelho, esta é a tarefa que os Teólogos da Libertação assumiram e por isso que foram e são combatidos pelos “tradicionalistas”, assim como os fariseus e os “Doutores da lei” combateram a Jesus Cristo.
Não é mais possível viver a Igreja com este equívoco triunfalista pessimista que é a Igreja concebida pelos “tradicionalistas”, uma Igreja que agride as pessoas com atitudes de nervosismo e medo, de autodefesa, que vê o mundo como um adversário, que faz da condenação e da denúncia da teoria da conspiração todo um programa pastoral. Uma instituição marcada pelo restauracionismo e passividade generalizada, sem atitudes de renovação, com o pecado da autorreferencialidade à flor da pele. Onde os bispos confundem liderança com autoritarismo e consideram-se líderes apenas quando os cristãos e as cristãs de suas dioceses estão submissos e silenciosamente obedientes.
É necessário urgentemente retornar para Jesus Cristo. Não apenas uma reforma religiosa, mas sim uma conversão ao Espírito de Jesus Cristo. Não apenas adesão doutrinal, mas seguimento. Não apenas mudanças, mas atualização da experiência fundante.
Este retorno à Jesus Cristo, ao Evangelho, esta conversão, este seguimento, esta atualização do primeiro chamado que Jesus Cristo fez aos Apóstolos e às Discípulas deve ser feito pelo povo, pois a hierarquia parece-me, não quer perder seus privilégios, por isso não tem interesse em provocar, motivar uma conversão e tampouco converter-se à Jesus Cristo.
Devemos retornar ao que é a fonte e a origem da Igreja. Deixar que o Deus encarnado em Jesus, o Filho de Maria, seja nosso único Deus. É preciso reformar e restaurar muita coisa, claro que sim, e fazer com que a doutrina seja a do Novo Testamento, mas, primeiro, é preciso voltar à fé em Jesus. Invocar um clima mais humilde, mais prazeroso, porque, caso contrário, seremos cada vez mais uma instituição decadente, mais sectária, mais rara, mais triste, mais distante do que Jesus quis e pelo qual Ele deu a Sua vida.
Jesus Cristo é um projeto, quase uma obsessão, uma necessidade imperiosa. Senão será tarde demais. Deixamos quase morrer a Ceia do Senhor, porque a Igreja não se questionou seriamente sobre a razão das pessoas saírem e buscar outras denominações, muitas vezes caindo nas mãos de mercenários da fé. Não houve uma “crise vocacional”, muita gente boa e abnegada quis e quer ser padre, dedicar todos os seus talentos e energias ao Reino, mas ao invés de acolhe-los e encaminhá-los, prefere-se ficar discutindo quem pode ou não pode ser ordenado.
É necessário e urgente voltar a entender Jesus Cristo como o que Ele realmente foi e o percebemos no Evangelho: “Um Profeta poderosos em atos e palavras” (Lc 24,19). Percebê-lo, segui-lo e imitá-lo.
É necessário e urgente que a Igreja reconheça seus pecados e se responsabilize por eles, questione suas falsas seguranças, duvide da auto “santidade”, porque santifica tudo e não vê as trevas que há dentro da Igreja, e assim não ilumina as trevas, não resplandece, é uma candeia colocada embaixo da mesa (cf. Lc 11,33).
Se a Igreja não escuta os clamores dos pobres, será surda. E, surda ficará muda. E, se muda não será capaz de anunciar o Evangelho de Jesus Cristo, o Evangelho livre e libertador, o único Evangelho que há.
É necessário e urgente reavivar o espírito profético do Movimento de Jesus. Não podemos nos resignar a viver uma religião cristã sem profecia.
É necessário e urgente uma presença mais ativa, indignada e atualizada da liderança cristã na sociedade, mas uma presença que se manifeste em serviço e testemunho assumindo a agenda dos movimentos sociais, dos pobres, dos excluídos, e nunca, nunca mais triunfalista. Esta presença deve esclarecer, por si só que a Igreja não é o mais importante, mas, sim, o Reino.
É necessário e urgente uma renovação espiritual com renuncia, humildade e autentica santidade dos lideres cristãos, deixando de lado carreirismos, vaidades, hipocrisias.
É necessário e urgente rememorar que o Cristianismo não é uma religião a mais, é uma religião profética, para construir um mundo mais justo, mais solidário, mais santo e esta justiça, solidariedade e santidade deve ser vivida e testemunhada antes pelo seu clero.
É necessário e urgente recuperar a compaixão. Pois ser compassivos é a única maneira de seguir Jesus Cristo e de nos parecermos com o Pai. A Igreja cristã perdeu a capacidade de atrair as pessoas, porque não levou a sério o sofrimento dos inocentes e deixou de solidarizar-se com as angústias dos pobres.
Precisamos continuar buscando caminhos, a partir da Igreja que cada vez tem menos poder de atração, ou devemos recuperar o Evangelho de Jesus como única força para transmitir e engendrar a fé? Hoje, o Evangelho se encontra aprisionado no interior de uma Igreja em crise, por isso é necessário e urgente recuperar o protagonismo do Evangelho.
Jesus Cristo no Evangelho é muito mais atual e real do que os sermões que nós, padres e bispos, damos. Deus não está em crise, nem está bloqueado. Jesus Cristo é o futuro da Igreja, um futuro “apaixonante”, mas para isso é necessário e urgente que seja o presente, Sua mensagem é necessária e urgente que seja vivida antes de testemunhada.
È necessário e urgente termos certeza do que somos, instrumentos de Deus, senão não teremos autoridade para pregarmos o Evangelho e ministrarmos os Sacramentos.
O Papa Francisco está inaugurando um tempo novo. Um novo estilo de Igreja simples, pobre, humilde, próxima e dialogante, que se preocupa com a felicidade do ser humano.
Se ele usa férula ou não, não é necessário nem urgente.
Se ele celebra de costas ou não, não é necessário nem urgente.
Se o Papa promove a mudança a partir de cima, nós devemos promover o Reino a partir de baixo. O Reino pretendido e anunciado no Evangelho de Jesus Cristo livre e libertador, o único Evangelho que há.
Isto sim é que é urgente e necessário...
Autor:Padre Antonio Piber.
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