A senhora e o
mouse
Nilza Tereza
Rotter Pelá
de Ribeirão
Preto, SP
Já fizera 55
anos quando considerou que não podia mais amedrontar-se diante do computador.
Depois de várias tentativas de executar tarefas mais complexas com a máquina,
quase todas frustradas, pensou em deixar para a outra vida, entretanto a idéia
não lhe parecia boa, até mesmo lhe dava uma certa tristeza. Toda a vida ouvira
dizer que querer é poder, estaria ficando preguiçosa ou com a vontade
enfraquecida?
Deu-se um
tempo conversou com pessoas de seu círculo de amizades, muitas a incentivaram a
persistir, outros a buscar atividade menos desgastante. Estava diante de um
difícil processo decisório. Optou por continuar.
Novas falhas,
novos desencantos, novas tristezas. Por que não conseguia? As crianças faziam
com tanta facilidade e conseguiam coisas maravilhosas. Tinha que haver uma
explicação além da idade e das falhas de memória. Passou a se observar e
analisar o que se apresentava como impeditivo de seu desenvolvimento, onde
estaria errando?
O primeiro
erro identificado foi "medo de errar", passou a observar que as
crianças não gastavam energia lamentando o erro, reservavam a energia para
buscar o acerto. Incluiu este comportamento no seu repertório. Depois percebeu
que as crianças não se sentiam na obrigação de saber e muito menos se
intimidavam em perguntar. Passou a perguntar, queria saber qual comando, qual
atalho, qual programa. Novas desilusões, as pessoas sempre solícitas a ajudar,
entretanto quando sozinha com a máquina, nada!
Afastou-se
embora inconformada, deixaria para depois quando tivesse um cérebro mais novo
em nova reencarnação e quando as máquinas estivessem mais evoluídas. Ledo
engano, isto lhe dava a sensação de derrota, sobretudo porque todos tentavam
ajudá-la a superar as dificuldades e repetiam e repetiam os processos para ela
que olhava atentamente, anotando tudo.
Eis ai a
questão, sempre que alguém se propunha a ajudá-la o primeiro ato era se apossar
do mouse e realizar as operações de maneira muito eficiente, mas extremamente
veloz, não lhe ensinavam, faziam por ela. Era preciso não aceitar este tipo de
ajuda, era preciso que lhe permitissem, mesmo que devagar, que realizasse ela
mesmo as operações.
Era preciso
tomar uma atitude, começou muito sutilmente a propor às pessoas que deixassem
ela mesma realizar os comandos, nenhum resultado, continuavam a tomar o mouse
de sua mão, precisava falar, mas não tinha coragem, afinal estavam ajudando.
Esta situação
persistiu até que a leitura do evangelho lhe mostrou o caminho "Que seja o
seu falar sim, sim, não, não". Entendeu finalmente que se quisesse manter
o mouse na mão deveria deixar isto bem claro para todos .
Nova
dificuldade, novo pedido de ajuda, esta chegou de forma atenciosa como sempre.
Primeiro gesto do "orientador": pegar o mouse. Seria agora, muniu-se
de coragem e disse que gostaria de explicar uma coisa: no seu tempo de infância
era proibido às crianças mexer nas coisas importantes da casa, sobretudo no
rádio e na vitrola pois eram objetos delicados e poderiam se danificar, assim,
ainda de alguma forma, para ela o computar era esta "coisa delicada"
e portanto tinha necessidade de manter o mouse em sua mão para sentir que podia
interagir com a máquina.
Quase riu com
o olhar de espanto do "orientador" quando ele disse que ela quem
havia pedido ajuda. — "Sim pedi ajuda, mas não pedi que fizesse por
mim", e qual não foi sua surpresa quando recebeu como resposta que ele
nunca havia pensado nisso, que de agora em diante quando solicitado à ajudar
estaria atento para não tomar o mouse de ninguém.
Este fato nos
traz muitas reflexões frente ao eterno objetivo de novos aprendizados, a) não
desistir diante da dificuldade, b) não nos sentirmos diminuídos quando
necessitamos de ajuda, mesmo que esta venha de pessoas muito mais jovens que
nós, c) colocar claramente o que estamos necessitando, d) não permitir que
façam por nós quando podemos nos esforçar para alcançar o aprendizado, e)
primeiro procurar as dificuldades em nós mesmos antes de atribuir a fatores externos,
f) sempre é hora, sempre é lugar e sempre é tempo de aprender, não importa a
fase da vida em que estivermos.
Lembremos
Irmão Jacob em seu livro "Voltei" quando nos lembra que educação é
fruto de "trabalho incessante".
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