Revista Espírita, janeiro de 1858
A intervenção de seres incorpóreos nas
minúcias da vida privada faz parte das crenças populares de todos os tempos.
Não pode, sem dúvida, caber no pensamento de uma pessoa sensata tomar ao pé da
letra todas as lendas, todas as histórias diabólicas e todos os contos
ridículos, que se gosta de contar ao lado do fogo. Entretanto, os fenômenos,
dos quais somos testemunhas, provam que esses próprios contos repousam sobre
alguma coisa, porque o que se passa em nossos dias, pôde e deveu se passar em
outras épocas. Que se aparte, desses contos, o maravilhoso e o fantástico dos
quais a superstição os vestiu ridiculamente, e se encontrarão todos os
caracteres, fatos e gestos dos nossos Espíritos modernos; uns bons,
benevolentes, prestativos em servir, como os bons Brownies', outros mais ou
menos traquinas, espertos, caprichosos e mesmo maus, como os Gobelins da
Normândia, que se encontra sob os nomes de Bogles na Escócia, de Bogharts na
Inglaterra, de Cluricaunes na Irlanda, de Puckas na Alemanha. Segundo a
tradição popular, esses duendes se introduzem nas casas, onde procuram todas as
ocasiões de brincar maldosamente: "Eles batem nas portas, deslocam os
móveis, dão golpes sobre os barris, batem no teto e no assoalho,
assoviam baixinho, produzem suspiros
lamentosos, tiram as cobertas e as cortinas dos que estão deitados, etc."
O Boghart dos Ingleses exerce particularmente
suas malícias contra as crianças, às quais parece ter aversão: "Arranca,
freqüentemente, sua fatia de pão com manteiga e sua tigela de leite, agita,
durante a noite, as cortinas de seu leito; sobe e desce as escadas com grande
ruído, joga sobre o assoalho as baixelas e os pratos, e causa muitos outros
estragos nas casas."
Em alguns lugares da França, os Gobelins são considerados
como uma espécie de fantasmas domésticos, que se tem o cuidado de nutrir com
iguarias, as mais delicadas, porque eles trazem, aos seus senhores, o trigo que
furtam dos celeiros de outrem. É verdadeiramente curioso encontrar essa velha
superstição, da antiga Gália e entre os Borussianos do século X (os Prussianos
de hoje). Seus Koltkys, ou gênios domésticos, vinham também roubar trigo dos
celeiros para levarem à aqueles de quem gostavam.
Quem não reconhece, nessas traquinagens, - à
parte da indelicadeza do trigo roubado, do qual é provável que os autores se
desculpavam em detrimento da reputação dos Espíritos - quem, dizemos, não
reconhecerá nossos Espíritos batedores e aqueles que podem, sem lhes injuriar,
ser chamados de perturbadores? Que um fato semelhante àquele que nos
reportamos, mais acima, dessa jovem de Panoramas, tivesse se passado no campo,
teria sido, sem nenhuma dúvida, levado à conta do Gobelin do lugar, depois de
amplificado pela imaginação fecunda das comadres; não faltará ter visto o
pequeno demônio pendurado na campainha, zombando e fazendo caretas aos tolos
que iam abrir a porta.
PUBLICADA SOB A DIREÇÃO DE ALLAN KARDEC
Todo efeito tem uma causa. Todo efeito
inteligente tem uma causa inteligente. O poder da causa inteligente está na
razão da grandeza do efeito.
Primeiro Ano – 1858
--Origem deste artigo:
Grupo de Divulgação da Doutrina Espírita
GDDE - Ano XII
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